Novelas e Religião

É comum que as novelas criem um universo próprio para que a trama se desenvolva conforme suas normas. Isso inclui, como podemos ver se pensarmos nas últimas novelas exibidas pela Rede Globo, a religião. Em cada trama, uma divindade nova pode ser cultuada e aquela que é escolhida para reger o Universo naquele momento não faz feio.


É assim na novela exibida atualmente no horário das 18h. Com o título de Paraíso, a trama gira em torno de uma menina que teoricamente fazia milagres na infância, recebendo a alcunha de Santinha. Na novela, católica, Santa Rita de Cássia é diversas vezes invocada e nunca deixa de operar seus milagres, que incluem a cura de uma coluna fraturada.


Logo mais a noite, no horário das 21h, quando vai ao ar Caminho das Índias, a religião hinduísta é que vigora e os mapas astrais são sempre corretos e condizentes com a realidade. E por meio desses mapas fraudes são descobertas, estratégias na vida dos personagens são traçadas...


Esses são apenas alguns exemplos. Cartomantes, se a novela é de ciganos, Alá, se de muçulmanos e por aí vai. A rede Globo é uma emissora laica. Pelo menos não está ligada a nenhuma instituição religiosa e nem é dirigida ou de propriedade de alguém que seja ligada a alguma dessas instituições. Mesmo assim, a missa do Padre Marcelo Rossi está na grade de programação a um bom tempo.


Já na Rede Record, a número dois na televisão brasileira, a coisa não é assim tão laica. A emissora, para começo de conversa, pertence a um bispo evangélico e, entre uma programação que incluei mutantes e vampiros, vários cultos e momentos religiosos também tem seu espaço.


E em tempos de crise entre essas emissoras, vale lembrar que a Rede Globo, sempre tão experimental em relação à religião de suas telenovelas, nunca criou um universo onde milagres foram operados por um evangélico. Aliás, talvez a melhor referência de um evangélico em uma novela da emissora seja a personagem da atriz Juliana Paes, na novela América, de 2005. Na trama, atriz vivia uma beata enquadrada no estereótipo de algumas vertentes evangélicas. Na época, as semelhanças de vestuário e discurso da personagem criaram polêmica e despertaram a indignação dos praticantes dessas vertentes religiosas uma vez que Creuza, a personagem, apresentava um comportamento promíscuo e mentiroso apesar de apresentar-se como uma moça religiosa e pudica. Na época, a emissora se defendeu afirmando que a personagem nunca havia citado nome de alguma religião ou aparecido em algum templo específico.


Se trata-se de uma coincidência ou se é mesmo uma forma subliminar de tocar uma ferida da rival, não podemos afirmar. Mas é interessante perceber como o universo da ficção abre um espaço quase neutro onde opiniões (às vezes de forma muito explícita) podem aparecer e revelar muito da filosofia de uma emissora.

1 comentários:

Gustavo Almeida disse...

Excelente observação Patrícia. Muito interessante seu texto! E fiquei impressionado com a Creuza...

 
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